quarta-feira, 29 de junho de 2011

Sopa, molho, chá e até sangue


Eventualmente sofro acidentes porque tenho também o hábito de comer lendo. Já encharquei um livro com sopa, enruguei outro com o conteúdo inteiro de uma xícara de chá e manchei páginas com molho ferrugem. Tá bom ou querem mais? Embora o acidente seja de outra área, já cortei o dedo na própria folha e manchou de sangue. Isso significa que literalmente os livros já têm o meu sangue! E casos como esses são os que eu lembro agora, mas foram incontáveis os incidentes similares.
Tudo isso porque não dissocio mais o ato de ler com o de comer. Talvez por morar sozinha, acho chato sentar direitinho, sem companhia, à mesa para as refeições. Vejo filmes em que os protagonistas comem em pé, escorados na pia da cozinha. Que coisa mais sem graça! E, na verdade, acho isso muito pior do que fazer a refeição comodamente sentado, ao mesmo tempo em que se lê alguma coisa. Ou seja: faço da refeição um prazer ainda maior. Deve ser por isso que estou sempre precisando começar uma dieta...
Mas a verdade é que tenho este hábito desde criança. Meus pais reclamavam, proibiam e ensinavam, mas eu reincidia e chegava todos os dias para o almoço com um livro sob o braço. E quem herda não furta, diz o ditado, meu super hiper mega avô fazia o mesmo. Ele conseguia ler um jornal tamanho standard e ouvir as notícias pelo rádio enquanto comia sem sequer sujar o bigode. Mas ele era um profissional, eu continuo amadora. Minha admiração era tanta que incorporei o hábito e, na casa dele, eu lia à mesa sem sofrer recriminações.
Levando em conta que é um costume tão antigo, eu já deveria estar mais safa e não deixar isso acontecer, mas o maior problema é a total distração e o envolvimento com o texto. E claro que tem a contrapartida: já perdi a conta das vezes em que, totalmente absorta, queimei a língua porque não reparei que a comida ainda estava quente demais.
E entre mortos e feridos, salvamo-nos todos.

Em tempo: a imagem é de uma bandeja de leitura em acrílico transparente que permite ao usuário ler e comer sem sujar a revista ou livro. Criação do designer coreano Yu-Hu Kin, que também já deve ter sofrido acidentes....

domingo, 26 de junho de 2011

Domingos perfeitos


Só existe uma coisa que eu goste mais do que acordar no domingo. É acordar num domingo em que chove, venta, faz frio e eu não preciso sair da cama. E posso rever “Friends” pela centésima vez. Como hoje. Mal consigo enxergar a rua pela janela, coberta por uma grossa cortina de pingos. Minha única atividade concreta foi trazer o café para tomar na cama.
E como gosto de paradoxos, pesquei “Sob o sol da Toscana” da estante e já mergulhei no verão escaldante da Itália. Gosto de livros que enfatizam o clima, tenho certa fissura por descrições metereológicas e sou a única pessoa da humanidade inteira – diz uma amiga – a acreditar em previsão do tempo. Talvez por isso eu goste de livros de viagens do tipo a-volta-ao-mundo-sozinho-em-um-veleiro ou escalações terrivelmente perigosas ao Everest. Gosto de lê-los, mas na mais absoluta segurança e conforto. Como disse acima, sou chegada num paradoxo.
E gosto de acordar cedo no fim de semana. Já tive um chefe, décadas atrás, o qual afirmava que a população de uma determinada cidade do país (não digo qual nem morta, não concordo, e adoro o lugar) acordava cedo para ficar mais tempo sem fazer nada. De qualquer forma, incorporei o pensamento: acordo – mesmo – mais cedo para curtir o dia sem compromissos. A única coisa que está na agenda é ligar para minha mãe e certificar-me de que ela está agasalhada até a alma. No mais, muitos livros e três tipos diferentes de chocolate me esperam. Bom domingo!

sexta-feira, 24 de junho de 2011

No ar


Leio em qualquer lugar. Em sala de espera, nos eventos intermináveis (escondida), nos cafés, em praças de alimentação nos shoppings e até em elevador. Já contei aqui meus tempos de faculdade em que pegava seis conduções por dia e lia durante as “viagens”. Mas o livro dentro de um avião, além de ajudar a passar o tempo e esquecer que estou confinada em uma caixa de metal a nove mil pés de altura, também me resguarda dos chatos.
Já perdi a conta do número de vezes em que enfiei a cara no livro para evitar conversas nas quais o ocupante da poltrona ao lado narra – longa e detalhadamente – a história da sua vida ou, o que é pior, desfia sua opinião a respeito do governo (qualquer um), do futuro da humanidade e, após arrancar de mim que sou jornalista, a baixa confiabilidade dos veículos de comunicação no Brasil e dos seus profissionais.
Cansei. Gato escaldadíssimo, sou monossilábica e, cara de paisagem, peço licença e vou lendo. Já fiz uma viagem de Brasília a Florianópolis sentada ao lado de um senador com o qual troquei apenas um breve cumprimento. E abri o livro. Aliás, com um audível suspiro de alívio, ele abriu o dele também, após perguntar o que eu estava lendo.
Se bem que chato profissional não se deixa abater por um livro. Começa perguntando qual é o tema, o autor, se é bom, diz quais são os seus favoritos se é que tem (nunca os meus) e, se não formos firmes, em breve estaremos envolvidos em uma longa conversa, quase impossível de interromper.
O único porém de ler dentro de um avião é o livro mais pesado literalmente falando. Ou seja, se tiver muitas páginas, cansa para segurar sem um apoio melhor do que as mesinhas para refeição. No mais, o livro mais fino é um grande companheiro desde a fila de espera do check in, passando pela muitas vezes longa espera por um vôo atrasado, até o trajeto propriamente dito. Reli “O Estrangeiro”, de Albert Camus, a partir do momento em que entrei no aeroporto em Porto Alegre até a aterrissagem em Florianópolis.
Antipática? Sem dúvida. Perco a chance de conhecer pessoas legais? Talvez. Mas é esse “talvez” que me segura. Lembro uma amiga que, sem o recurso do livro, interrompeu um papo horrível dizendo que precisava reclinar a poltrona ou iria devolver de forma pouco educada o almoço. O restante do vôo aconteceu em absoluto silêncio.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Livros “difíceis”


Só venci a vergonha (hein?) por ter tido grande dificuldade com Proust depois que li José Mindlin confessar em “Uma vida entre livros” que também passou por isso. Ele inclusive recomendava insistência por parte do leitor, que não devia abandonar a obra. Já disse aqui que tentei ler Ulysses, de James Joyce, três vezes. Também não consegui terminar de jeito nenhum “Henderson, o rei da chuva”, de Saul Bellow, e “Vitória”, de Joseph Conrad. Podem até ser ótimos livros, mas que leitura que não andava...
Em compensação, amei livros que amigos consideraram áridos, como “A montanha mágica”, de Thomas Mann, e “Arquipélago Gulag”, de Aleksandr Solzhenitsyn. “O outono do patriarca”, de Gabriel Garcia Márquez foi outro livro que li de forma bastante veloz, apesar dos parágrafos quilométricos e a quase ausência de pontuação. Cheguei à conclusão que o gosto por literatura é como o gosto pela comida. Vá explicar porque eu não gosto de cebola e amo alho. E porque eu não suporto coco e sou louca por opções mais “exóticas” como fruta do conde. Se não houvesse gosto literário o que seria de autores que considero uma tragédia e que vendem horrores?
Mas a verdade é que eu resisto a abandonar a leitura de um livro. Sei lá, acho traição. Raros foram os que larguei e não voltei a fazer nova tentativa. Taí Proust que não me deixa mentir.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Amor bruto?


Dobro, risco, desenho, sujo e marco as páginas dos meus livros. E daí? Esse é – além de um pouco aconselhável sentimento de posse – um dos motivos de eu não gostar de ler livros emprestados. O outro motivo, que não é novidade, é que gosto de ter bem à mão aquilo que me interessa. Outro dia descobri que a minha afilhada também é assim. Embora não sejamos do mesmo sangue, a convivência ao longo dos anos mostra que o fruto não cai – mesmo – longe do pé. Mas voltando ao tema principal: já fui execrada por estes hábitos tão pouco condizentes com o meu amor pelos livros. Mas acho coerente, afinal, tal comportamento apenas denota muita intimidade. Intimidade que inclui pegar no sono com livros ao meu lado na cama a ponto de, com um golpe de edredom, lançá-los ao chão junto com óculos, sem a menor cerimônia. Já anotei números de telefone em páginas de livros (e quando os releio fico morta de curiosidade acerca do possível “anotado”) e já sofri acidentes porque tenho também o hábito de comer lendo – outra hora falo sobre isso. Horrível? Não. Para mim tudo isso é normal. Anormal é deixar livros dormindo para sempre em estantes, criando bolor e ácaros sem irem para a vida. Anormal é não ler, é ver o filme e não ler o livro, é ler as resenhas e achar que está bom. Acho que, guardadas as devidas proporções, livro é como filho: por mais que os amemos, precisamos berrar com eles de vez em quando. Mas até o berro é sinal de amor. E tenho dito.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Preguiça, saldos e tapetes. Não necessariamente nessa ordem


Ando preguiçosa para tudo. Para escrever, para trabalhar (que, afinal, é a mesma coisa) e o que é muito pior: para seguir arrumando os livros de forma criativa na minha nova casa. Não sei se é o inverno (o apartamento com piso de pedra é gelado, apesar de eu tentar minimizar com tapetes) ou se cheguei a uma encruzilhada: a pilha de livros a ler não para de crescer e o meu hábito de buscar coisas antigas na estante para reler não ajuda muito a baixá-la.
Do outro lado do calçadão onde fica o meu escritório, no centro da cidade, há uma mega store que eu costumo frequentar. A intervalos regulares sai uma promoção de livros a R$ 9,90, mas a verdade é que até hoje só consegui extrair três livros dali. Acho que além de preguiçosa estou cada vez mais seletiva, incluindo o fato de que estou lendo cada vez menos ficção. Ou as livrarias estão mesmo tentando desovar enormes estoques encalhados. Se eu fosse escritora morreria ao ver o fruto do meu suor numa pilha de saldos. E olha que aparece muita gente boa ali...
Enquanto isso, vasculho lojas de móveis esperando esbarrar em uma estante linda e barata, afinal, de esperança também se vive. Consegui uma micro estante precisando de pintura (oi! e a preguiça?) e acho que bem arrumadinha não vai fazer feio na sala. De graça, até ônibus errado.
Mas todo esse nariz de cera é para dizer que apesar da preguiça, não vou deixar de postar aqui. Gosto de pensar que esse blog é uma espécie de diário moderno, a exemplo do que eu fazia quando adolescente em cadernos brochura encapados para disfarçar. Sim, eu já tive diário. Morro de pena ao lembrar que me desfiz deles quando saí da minha cidade para fazer faculdade em Porto Alegre. As coisas que já me arrependi de ter apagado, rasgado e queimado são tema para um livro. Mas como eu digo sempre, isso já é outra história.